Loucura: uma questão de interpretação
A chamada loucura incomoda a humanidade desde os primórdios, pois temos o
costume de não aceitar o que nos envergonha, que quebra padrões
pré-estabelecidos, principalmente se este for em nossa casa. Dizem que os
loucos se parecem com crianças por desconhecer regras, fazer em público coisas,
diríamos “indecentes”, falar o que se passa pela cabeça, enfim, todo mundo
condena os loucos nas ruas, mas se esquece de que entre quatro paredes às vezes
é capaz de fazer verdadeiros absurdos, mas, “ninguém viu...”. E em relação à
criança vemos pais “passarem vergonha” com seus filhos na rua por conta de
“artes” que a criança faz. Daí a importância da babá para os mais abastados:
“criança tem que ter limite”, pelo menos é o que procuram fazer há séculos com
as nossas crianças, por isso existe a escola padronizada, com currículo igual
para todos, com o intuito de nos fazer uma Sociedade Uniforme. De criança
falarei em outro momento, mas é bom que pensemos o que bom para nossa família,
sem a contaminação da hipocrisia delirante.
Falar do sofrimento e das alegrias
dos usuários do CAPS é o mesmo que avaliar a vida de qualquer ser humano e
fazer um inventário; estudá-lo a fundo. Todos temos, alto e baixos, “de perto ninguém é normal”, a diferença
é a patologia; uns são diabéticos, outros hipertensos, tem as enxaquecas em que
as senhoras ficam num quarto escuro por um dia às vezes, câncer e enfim,
precisaríamos do Código Internacional de Doença para sabermos pelo menos as que
são reconhecidas cientificamente.
Cada um tem a sua dor, e expressa em
forma de doença patológica os males psicossomáticos; toda a humanidade está
sofrendo de um mal que é ainda pior; a indiferença pelo outro, pois estamos
ficando tão egoístas que nem nos lembramos de proteger o Planeta, nossa nave
Mãe. Passemos agora a pensar nos seres humanos como parte da natureza, que
precisam de ar, alimentação, habitação e principalmente solidariedade para
viver; ou a herança material que tanto cuidamos para os nossos filhos, não fará
diferença nenhuma, pois eles, se resistirem, terão que habitar um ambiente
árido e inóspito e jogarem fora toda a EXCELÊNCIA, por muito trabalho pesado na
reconstrução do mundo. Enquanto isso ainda é uma hipótese, pensemos melhor e
vejamos que não existe diferença essencial na humanidade; ao menos a terra que
abriga todos os seus filhos democraticamente; que tenhamos consciência agora de
que todas as criaturas são semelhantes, cada um com sua limitação e/ou talento,
mas, simplesmente humanos.
·
Sabendo que esse Projeto foi feito sob a
inspiração do Método Paulo Freire, Darcy Ribeiro, vivendo outra realidade, que
foi a convivência com índios, que lhe rendeu muita experiência e inúmeras
publicações, Carl Roger, psicólogo americano que pregava o humanismo como forma
de vida e aplicava no seu trabalho de consultório e na Educação, pregando a
liberdade de aprendizado ainda em meados do século XX. Também buscando no
psicólogo Vygotsky, em suas obras, a importância que o meio exerce sobre as
pessoas, e seu trabalho dirigido a crianças, onde aborda a importância do
convívio com outras pessoas e conclamando a comunidade a se inteirar. Cada um
respeitando as singularidades do outro. Também o filósofo contemporâneo, Edgar
Morin, nos faz pensar no planeta como um todo e nós, partículas que dão
existência ao Todo. Para ele o mundo é como uma teia de aranha; estamos todos interligados,
porém se algo ou alguém se move de forma perigosa, coloca em risco o Todo, no
caso desse tecido se romper. Daí a importância de cuidarmos com muito carinho
do nosso próximo, ele é um prosseguimento meu.
Obs. Este é um Pré-Projeto Pedagógico de Letramento e
Recreação, dirigido aos CAPS, Centro de Atenção Psicossocial, com atividades
lúdicas, abordando vivências do cotidiano de cada um e norteando o usuário no
seu processo de resgate de cidadania.
È uma pretensão minha, trabalhar com pessoas que a sociedade
tem vasto pré-conceito, e mediar o
crescimento e acompanhar de cada usuário do CAPS-Pádua-RJ, que são pessoas
lindas interiormente; ativas nas oficinas de: Edição do Jornal do CAPS, fazendo
sabão com óleo reciclado e outras terapias existentes.
Quanto a mim; usuária do CAPS também, 1996, após um surto
psicótico, em que fui rotulada pelo CID – Código Internacional de Doença, de
ser portadora de Transtorno Bipolar Afetivo de Humor. O surto veio e passou;
tomo os meus medicamentos, trabalho, estudo, sou mãe, dona de casa, chefe de
família; tenho amigos (tanto próximos quanto virtuais que eu amo), e a vida
prossegue entre vales e montanhas. Tenho hoje 50 anos, dos quais, 16 eu convivo
com a “loucura” e a “sanidade”; tenho altos e baixos como qualquer humano, mas
me sinto muito feliz de poder trabalhar, pesquisar e colaborar com os companheiros
que necessitam.
Tânia Maria da Silva
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